quarta-feira, 2 de maio de 2012

Um dia numa escola... Sociologia da Educação

Após uma semana de trabalho de um professor recém-formado, ouço a seguinte pergunta:" È comum os professores reclamarem tanto assim ? Parece que detestam o seu trabalho ".

O jovem professor, com o tempo, chegará a uma resposta.E não é resposta que se ensina, e sim aprende vivenciando e questionando sempre. É uma resposta pessoal, dele, e apesar de me deixar com a língua coçando, me contive


Fomos embora e nocaminho de casa fui pensando . . .As pessoas querem encontrar algum sentido no trabalho, porque é aí que passam a maior parte de seus dias.Será que esse sentido foi abalado nos profissionais da Educação?
Segundo o sociólogo Richard Sennett, " As transformações econômicas estão tirando da vida das pessoas coisas importantes como a lealdade, compromisso, solidariedade e, se você olha de fora e examina a situação de um ponto de vista material, parece que as pessoas nunca estiveram tão bem no trabalho " ,
Mostrando o que está por trás das aparências,Sennett, "afirma que as pessoas estão pagando um preço alto para sobreviver na nova economia que é confusa, insegura e depressiva para as pessoas que trabalham nela."
A falta de uma política educacional séria, sem influência de modismos, que valorize a opinião dos professores – que é quem realmente coloca "a mão na massa" - , e os vários projetos das Secretarias de Educação, que caem de pára-quedas nas escolas, sendo um instrumento que tem a finalidade única de publicidade de governos para fins eleitorais , levaram os educadores a visualizarem o governo como uma instituição que não tem compromisso de priorizara busca de uma Educação de qualidade. Sendo os discursos e suas práticas em sua maioria demagoga.
Não sendo valorizado (e não digo só no salário), a motivação do funcionário despencou.
Serão os professores culpados pela baixa qualidade na Educação brasileira ?
O que vemos nas matérias jornalísticas veiculadas nacionalmente é que sempre concluem que o culpado é o professor, que não sabe dar aulas criativas ( pois se tem toda a estrutura escolar favorável a isso, não o faz por irresponsabilidade), que nuncaquer se aperfeiçoar ( pois tem tempo de sobra para isso), e a última,que a evasão escolar e o nível precário de aprendizagem é culpa também desse professor.
Coitado !Virou agora "bode expiatório"E nem tente se justificar !É você o culpado e ponto final.Assim, com a mídia a anos ajudando a desmoralizar e desvalorizar a função de professor junto a sociedade, tem como não se sentir triste e angustiado ?
Nunca lembram de cobrar a responsabilidade das outras instâncias de poder, família, e dos governos, pois este sim éque tem todo o poder e o controle das decisõesno setor educacional.
O trabalho alienante do professor, aonde ele se sente uma mera peça no processo produtivo,faz sentir o trabalho como obrigação de sobrevivência e menos prazeroso.
Nossoprazer está em ensinar servindo de orientação as novas gerações, apesar de tantas dificuldades.Acredito que se a sociedade soubesse que apesar de todas as dificuldades, conseguimos ainda ensinar nossos jovens, ela nos veria como heróis nacionais.
Numa sociedade, que a educaçãoé voltada para investimentos decurto prazo, é difícil os governantes perseguirem objetivos de longo prazo ( não traz votos ), temos que aprender como fizeram os países de Cuba, Uruguai, Costa Rica e Coréia do Sul, que pensam o acesso e a permanência de alunos na escola como uma política de Estado e que apostaram na Educação pública, fazendo investimentos educacionais de longo prazo e com metas e regras claras para a sociedade.
É preciso que o educador entenda que suas queixas, têm nome e endereço completo, e é preciso ter uma visão do todo, contextualizando sempre, para não se cometer injustiças contra si mesmo e seus colegas de trabalho, ou seja, julgando e sendo julgado.
O professor e pesquisador argentino Gustavo Fischman contribui para a nossa reflexão com as seguintes palavras:
" Nos anos 80 e 90, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional( FMI ) --agências da ONU, forçaram políticas de ajustes econômicos que tiveram grande efeito sobre a Educação na América Latina. Os planos implicavam, em muitos casos, condicionar créditos financeiros a mudanças no sistema educacional dos países. O Banco Mundial achava que investir no ensino fundamental era muito mais produtivo ( para o sistema econômico capitalista ) do que no universitário. Hoje o banco reconhece que essa política se baseava em pesquisas insuficientes. Mudou-se toda uma política de Educação na América Latina a partir de um modelo que não era sólido."
A nossa LDB, Lei N.º 9.394/1996 foi elaborada sob a influência deste contexto mundial.
Os professores, com certeza lembram da angústia que tivemos na implantação do Regime de Progressão Continuada no Ensino Fundamental, resolução N.º 8086/1997 em Minas Gerais, que caiu de pára-quedas em nossa cabeça, com o conhecido manual "Ciclos de Formação Básica", pondo fim a reprovação, sendo o aluno automaticamente promovido nos Ciclos; lembram da pressão da Secretaria de Educação, através de suas superintendências por aprovação de alunos que os relatórios das supervisoras e professoras apontavam com deficiência na aprendizagem, e que não eram aceitos como justificativa de retenção pela Secretaria.
Lembram da criação do cargo de Especialista, juntando orientador e supervisor no mesmo "pacote"? Sabíamos que o motivo era, de novo, ocontrole de gastos. Querem fazer uma educação nacional de qualidade, gastando pouco dinheiro. Isso não é possível, não se pode medir esforços e brincar com a formação intelectual de nossas crianças e jovens. Este sim é um investimento nobre para o Brasil, que deveriam todos acreditar.
Lembram do "Projeto Acertando o Passo", que sem respeitar o ritmo dos alunos, também acelerou a queda nas taxas de reprovação.
Lembram da exigência da LDB de presença mínima de 75% a ser computada no final de cada ciclo ( 3 anos ), que sabíamos de difícil operacionalização e que seria uma ação prejudiciale desmotivadora nos alunos.
Aqueles momentos de angústia, aonde os professores se sentiam ignorados em sua experiência, se refletem até hoje.
 Vamos lembrar, agora,da cronologia de alguns fatos que originaram essas políticas desastrosas :
·Em Março de 1990 aconteceu a "Conferência Mundial sobre Educação para Todos", realizado em Jomtiem, Tailândia e na seqüência outro encontro na Unicef House, New York, USA em 1991.Desses encontros foram tiradas pela ONU diversas declarações, que culminaram nas Normas Uniformes para a Educação, que orientaram as mudanças nos sistemas educacionais dos países da América do Sul.
·A Declaração de Salamanca, linha de ação, realizado pela Unesco, na Espanha em 1994.
Os jornais de 1998 lançavam manchetes que mostravam a angústia das escolas em seu cotidiano :"Sem "bomba", indisciplina cresce entre os jovens"Estado de Minas,13/10/98,pág 24;" O que deveria ser uma revolução no ensino se transformou em um grande transtorno para os educadores e gerentes dos sistemas de ensino" , Jornal EM, 11/10/1998, pág. 32,33.
Revistas nacionais também torturavam os professores apoiando a cópia dos modelos educacionais estrangeiros, exaltados como "modernidade", pressionando e sugerindo que os educadores precisavam reciclar suas idéias, ou seja, apoiar o novo modelo de educação para ser moderno.
" A máquina que cospe crianças" – Finalmente o Brasil entendeu que só vai sair da crise quando resolver a tragédia do ensino básico ", assim a Revista Veja, de 20/11/1991, pág46, justificou a necessidade do novo modelo educacional que surgia. Nesta matéria existe a cobrança de investimentos em Educação como os que foram feitos pelos Tigres Asiáticos, fato que me preocupa quando leio na revista veja de 16/02/2005,a seguinte manchete :
" Revolução pela Educação " – " A Coréia fez, o Brasil também pode fazer", e me preocupa ainda mais as propostas dos candidatos nas eleições para presidente de 2006, que defendiam a adoção de modelos estrangeiros, se queremos crescer.
Será que não estamos, de novo, acreditando em idéias salvadoras e em modelos educacionais que servem aquela realidade específica, e abrindo mão de pensar o nosso modelo de Educação nacional, que leve em consideração a opinião de todos que participam no processo educativo ? Essa mesma matéria nos alerta "Criança de 6 anos Kang Jim Won chora compulsivamente no meio da sala de aula porque tirou nota vermelha em matemática. " Sou um fracasso ! Desespera-se a menina," continuando, " Pais coreanos preocupados com o excesso de disciplina e cobrança em crianças menores estão mandando seus filhos estudarem no Estados Unidos " , e mais recente, o jovem estudante coreano numa Universidade americana assassinou várias pessoas, e a reportagem afirmava que os pais foram com a família para os E.U.A. ,buscando melhor condição de vida. Fico a pensar... Um país desenvolvido, exemplo de investimento em Educação, em tecnologia, as crianças que estão sendo formadas neste modelo educacional atendem as nossas expectativas ?
O professor de Educação da Universidade de Hanyang, em Seul, Yun-Kyung Cha, em sua entrevista publicada na Revista do Professor – MEC outubro /2003, nos deixa ainda mais preocupados: " Yung diz que, para a maioria dos coreanos, o significado da educação formal está em seus valores instrumentais: a educação é, para eles, simplesmente um meio de ascensão social e de riqueza material, estando ausente a perspectiva humanitária."
 "Ele ressaltou que a expansão educacional impulsionada pela cobiça humana não tem capacidade de transformar o mundo em um lugar melhor para se viver", e continua "Nossa sociedade precisa de seres humanos, generosos, que exercitem a compaixão, e não de pessoas egoístas e competitivas".
Vejam que a reflexão que a perguntado jovem professor recém-formado nos possibilita fazer, é muito mais complexa e merece nossa total atenção nos detalhes.
È claro que o erro estratégico do governo teve alguns pontos positivos, quando nos trouxe temas para reflexão que não estavam na pauta, como: preocupar com o ritmo do aluno, a importância da didática e da participação efetiva da família na escola.
Também não poderia deixar de contemplar as idéias de Karl Marx quando ele afirma, "que o trabalho, na sociedade capitalista é alienado do trabalhador porque quem produznão detém, não possui nem domina os meios de produção." e " a alienação do homem, do produto e do processo de seu trabalho é uma conseqüência da organização do capitalismo moderno."
Com muita propriedade, Frei Betto em seu artigo semanal do jornal EM 16/06/2005 Espaço Cultura, contribui dizendo que, "Um dos mais perniciosos argumentos do pensamento burguês é a idéia de que as coisas dependem de vontades individuais. Assim, a Educação não funciona bem por culpa dos professores"." Essa visão distorcida da realidade serve para encobrir os mecanismos por trás das relações pessoais. Ao delegar à esfera individual os males sociais , o sistema capitalista preserva a sua natureza cruel: é inevitável a desigualdade social neste tipo de organização" e fechando sua contribuição ele diz "Não há outra alternativa: ou reforçamos os movimentos populares" na busca por uma maior participação no processo produtivo, "ou ficaremos reféns de políticos que depois de eleitos, seguem seu próprio interesse em detrimento do interesse coletivo."
Concluindo, acredito que nós professores temos que buscar sempre a visão da totalidade em nossas reflexões da prática educativa, e humildemente entender que estamos juntos no mesmo barco, evitando assimfazer ojulgamento de nossos colegas e procurandoum culpado por nossas decepções e angustias no trabalho que com certeza não atende as nossas expectativas como categoria profissional.
Já pararam para pensar:Quem fica feliz com nossa desorganização como classe ?
Quem fica feliz quando não conseguimos nos unir e nos mobilizar politicamente?
Acredito que nosso desejo comum é de participar de um verdadeiro projeto de Educação de qualidade em nosso país.Se possível sem as demagogias atuais.
Por isso, este ponto de vista é a vista de um determinado ponto, e essa foi nossa humilde contribuição para a reflexão que se faz, urgentemente necessária, entre os educadores.
Então, volta a pergunta: Porque os professores se queixam tanto, no ambiente de trabalho?
Celso Elias Moreira, Professor de Sociologia, da rede pública de MG – Artigo escrito em Abril / 2007 
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Convívio escolar - A violência na escola

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Domínio de classe

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Professores são educadores não babás


 Autor do 2º artigo mais compartilhado no Facebook em 2011, americano diz que pais desrespeitam regras de escolas, pondo em risco o futuro dos filhos

Nathalia Goulart

Professor Ron Clark é retratado com seus alunos.

Ron Clark e seus alunos: em defesa de mais cooperação entre pais e professores (Divulgação/Ron Clark Academy)


"Hoje, existe uma preocupação grande com a auto-estima da criança. Por isso, muitas pessoas se veem obrigadas a dizer aos pequenos que eles fizeram um ótimo trabalho e que são brilhantes, mesmo quando isso não é verdade"
O segundo artigo mais compartilhado em 2011 por usuários americanos do Facebook foi escrito por um professor, Ron Clark (o primeiro trazia fotos da usina de Fukushima). Mais de 600.000 pessoas curtiram o texto na rede, escrito a pedido da rede de TV CNN e intitulado "O que os professores realmente querem dizer aos pais". O artigo descreve um cenário de guerra, travada entre pais e professores. Na visão de Clark, os pais vêm transferindo suas responsabilidades para a escola, sem, contudo, aceitar que seus filhos se submetam de fato às regras da instituição. Por isso, assim que surge a primeira nota vermelha ou uma advertência, invadem a sala de aula culpando os professores – a pretexto de preservar a reputação e o orgulho de seus filhos. "Precisamos estar mais atentos à excelência acadêmica e menos preocupados com a auto-estima das crianças", diz o professor, na entrevista concedida a VEJA.com e reproduzida a seguir. "Essas crianças deixam de aprender que é preciso se esforçar muito para conseguir bons resultados. No futuro, elas não terão sucesso porque, em nenhum momento, exigiu-se excelência delas." Clark conhece sua profissão. Aos 39 anos, vinte deles dedicados à carreira, o americano já lecionou na zona rural da Carolina do Norte, nos subúrbios de Nova York e atualmente comanda uma escola modelo no estado da Geórgia que oferece treinamento a educadores. Graças à função, manteve, desde 2007, contato com cerca de 10.000 educadores de diversas partes do mundo, incluindo brasileiros.

Em seu artigo, o senhor fala de um ambiente escolar em que pais e professores não se entendem mais. O que tornou a situação insustentável, como o senhor descreve? 

A sociedade se transformou. Hoje, vemos pais muito jovens, temos adolescentes que se veem obrigados a criar uma criança sem ao menos estarem preparados para isso. São pessoas imaturas. Por outro lado, temos famílias abastadas, em que pais trabalham fora e são bem-sucedidos profissionalmente. Pela falta de tempo para lidar com os filhos, empurram toda a responsabilidade da educação para a escola, mas querem ditar as regras da instituição. Ou seja, eles querem que a escola eduque, mas não dão autonomia a ela.

Que tipo de comportamento dos pais irrita os professores? 

Acho que o ponto principal são as desculpas que os pais criam para livrar os filhos das punições que a escola prevê. Se um aluno tira nota baixa, por exemplo, ou deixa de entregar um trabalho, os pais vão à escola e descarregam todo tipo de desculpa: dizem que o filho precisava se divertir, que a escola é muito rigorosa ou que a criança está passando por um momento difícil. Ou, ainda, culpam os professores, dizendo que eles não são capazes de ensinar a matéria. Mas nunca culpam seus próprios filhos. É muito frustrante para os professores ver que os pais não querem assumir suas responsabilidades.

Problemas com notas são bastante frequentes? 

Sim. Certa vez tive uma aluna que estava indo mal em matemática. A mãe dela justificou-se dizendo que, na escola em que a filha estudara antes, ela só tirava boas notas, sugerindo, assim, que o problema éramos nós, os novos professores. Infelizmente, essa ideia se instalou na nossa sociedade. Se a nota é boa, o mérito é do aluno; se é baixa, o problema está com o professor. E quando as notas ruins surgem, os pais ficam furiosos com os professores. O resultado disso é que muitos profissionais estão evitando dar nota baixa para não entrar em rota de colisão com os pais, que nos Estados Unidos chegam a levar advogados para intimidar a escola.

Os pais poupam os filhos de lidar com fracassos? 

Hoje, existe uma preocupação grande com a autoestima da criança. Por isso, muitas pessoas se veem obrigadas a dizer aos pequenos que eles fizeram um ótimo trabalho e que são brilhantes, mesmo quando isso não é verdade. Essas crianças deixam de aprender que é preciso se esforçar muito para conseguir bons resultados. No futuro, elas não terão sucesso porque, em nenhum momento, exigiu-se excelência delas. Precisamos estar mais atentos à excelência acadêmica e menos preocupados com a autoestima das crianças.

Que conselho o senhor dá aos professores? 

É possível evitar que os pais surtem diante de notas ruins e do mau comportamento dos filhos se for construída uma relação de confiança. Em vez  de só procurar os pais quando as crianças vão mal na escola, oriento que os professores conversem com os responsáveis também quando a criança vai bem. Na minha escola, procuro conhecer os pais de todos os meus alunos. Procuro encontrá-los com frequência e envio cartas a eles com boas notícias. Assim, quando tenho que dizer que a criança não está rendendo o esperado, eles me darão credibilidade e confiarão na minha avaliação.

É possível determinar quando termina a responsabilidade dos pais e começa a da escola? 

As duas partes precisam trabalhar em conjunto. Os pais precisam da escola e a escola precisa do apoio da família para realizar um bom trabalho. Um conselho que sempre dou aos pais é que nunca falem mal da instituição de ensino ou do professor na frente dos filhos. Se a criança ouve os próprios pais desmerecerem seus mestres, perde o respeito por eles. O contrário também é verdadeiro. Os professores precisam respeitar os pais, porque eles são parte fundamental na educação de uma criança.

Em algumas situações a discussão sobre responsabilidades da família e da escola surge com muita força. Em casos de bullying, por exemplo, pais e professores trocam acusações. Sobre quem recai a maior parte da responsabilidade nesses casos? 

A minha resposta novamente é que precisamos trabalhar em conjunto. Quando o bullying acontece na escola, é obrigação dos professores intervir imediatamente. Mas muitos não agem assim porque querem evitar conflitos com os pais. E isso é muito grave. O bullying está devastando nossas crianças. Precisamos combatê-lo. Para que os professores tenham liberdade para agir, precisam do apoio dos pais. Mas você sabe o que acontece? Muitas vezes, quando os pais são chamados na escola para serem alertados de que seu filho está praticando bullying contra um colega de classe, o que ouvimos é: "Mas qual o problema disso? Tenho certeza de que outros colegas também zombam do meu filho e ele não se sente mal por isso." Mais uma vez, vemos os pais se esquivando da responsabilidade.

A que o senhor atribui o sucesso do artigo que estourou no Facebook? 

Eu escrevi o que todos os professores tinham vontade de dizer aos pais, mas não podiam dizer, porque isso os enfureceria. O que eu fiz foi dar voz a milhões de profissionais. Fiquei sabendo que muitas escolas imprimiram o texto e enviaram uma cópia a cada família. Na internet, pessoas de outros países também compartilharam a minha mensagem.

O senhor criou uma escola modelo, a Ron Clark Academy. Como é a relação de seus professores com os pais? 

Procuramos estabelecer uma relação próxima. Como eu disse, estamos constantemente em contato com os pais, nos bons e nos maus momentos. Também promovemos encontros semanalmente, nos quais ofereço aos pais a oportunidade de assistir a uma aula na escola, destinada exclusivamente a eles, para que acompanhem o que está sendo ensinado a seus filhos. Ou seja, trabalhamos muito para conquistar uma relação harmônica. Não estou dizendo que é fácil lidar com os pais. Alguns deles podem ser bem malucos.

O senhor, na sua escola, recebe professores de diversas partes dos Estados Unidos e tambem de outros países, como o Brasil. Além dos problemas de relacionamento com os pais, do que mais professores de todo o mundo reclamam? 

As avaliações tiram o sono dos professores. Não sei exatamente como funciona no Brasil, mas nos Estados Unidos os professores são constantemente cobrados a melhorar o desempenho de suas escolas em testes padronizados. E todo o processo educacional passa a girar em torno de algumas provas. Isso é massacrante, para os alunos e para os professores. Os professores precisam de mais diversão na sala de aula.



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terça-feira, 1 de maio de 2012

A Sociedade sem escolas - Ivan Illich

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O veneno está na mesa

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A Onda - 1981

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segunda-feira, 30 de abril de 2012

Escolas matam a criatividade? - Ken Robinson

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Mudando paradigmas em Educação

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Aprendizagem

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sábado, 28 de abril de 2012

O Mestre da Vida

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Escritores da Liberdade

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Como estrelas na Terra

Como Estrelas na Terra é um filme indiano. Como estrelas na terra relata, essencialmente, a história de vida de uma criança com dislexia. Retrata, de forma bastante clara e elucidativa, as emoções do disléxico e as reações familiares, assim como as consequências familiares e sociais.
Este filme é excelente tanto para crianças ou jovens com dislexia, como para os seus pais e educadores. Explica de forma simples o que é dislexia, quais as suas principais características e indica algumas dicas para pais e professores de disléxicos, assim como demonstra o amor incondicional que é fundamental para que estas crianças e jovens sejam bem sucedidos.
Demonstra também o quanto pode ser eficaz o ensino de forma multisensorial, ou seja utilizando todos os sentidos, assim como a utilização da arte como factor motivacional e de crescimento.
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Pro dia nascer feliz - João Jardim

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Questões sobre a organização do trabalho na escola - Selma Garrido Pimenta


O objetivo desta discussão é contribuir com supervisores de ensino, diretores de escola e professores na importante e urgente tarefa de construir um novo fazer da ação supervisora. Entendemos que este "novo" se volta no sentido de que a Escola Pública se qualifique cada vez mais na construção coletiva de seu projeto político-pedagógico, cuja finalidade é formar no aluno o "novo cidadão".

O texto parte do entendimento de que os sistemas de ensino existem como instrumentos que garantem a continuidade da ação educativa sistematizada e de que, por isso, todas as suas ações têm como meta possibilitar que as escolas cumpram suas finalidades.

Iniciamos este trabalho explicitando o entendimento que temos de "novo cidadão" e como a Escola se coloca diante da exigência de formá-lo. Destacamos, a seguir, algumas questões sobre a organização do trabalho no seu interior, tais como o projeto político-pedagógico, o trabalho coletivo, o conhecimento e as competências pedagógicas.

Por fim, discutimos algumas dificuldades e' entraves a serem considerados

Finalidade da Educação Escolar - O "Novo Cidadão"

Formar o novo cidadão (o cidadão necessário) no aluno significa formá-lo com capacidade para ter uma inserção social crítica/transformadora na sociedade em que vive. Ou seja, a sociedade civilizada, fruto e obra do trabalho humano, cujo elevado progresso evidencia as riquezas que a condição humana pode desfrutar, revela-se também uma sociedade contraditória, em que grande parte dos seres humanos está à margem dessa riqueza, dos benefícios do progresso, da humanização, enfim. Assim, educar na Escola significa ao mesmo tempo preparar as crianças e os jovens para se elevarem ao nível da civilização atual - da sua riqueza e dos seus problemas - para aí atuarem. Isto requer uma preparação científica, técnica e social.

Por isso, a finalidade da Escola é possibilitar que os alunos adquiram os conhecimentos da ciência e da tecnologia, desenvolvam as habilidades para operá-los, revê-los, transformá-los e redirecioná-los em sociedade e as atitudes sociais - cooperação, solidariedade, ética -, tendo sempre como horizonte colocar os avanços da civilização a serviço da humanização da sociedade.

Tarefa ampla, complexa e nova!, que requer que as escolas, os sistemas de ensino se direcionem, se organizem, se equipem para isso; revejam sua organização e se organizem de um modo novo. Esse novo precisa ser construído a partir do já existente, pelos atores da Educação - os profissionais, os alunos, as famílias.

Para chegar à explicitação da nova organização é necessário que a Escola traduza para si, especifique e detalhe os avanços e os problemas da civilização atual - a riqueza e a miséria: a fome, a falta de moradia, de trabalho, a violência, a acumulação, a barbárie etc. Quais desafios a problemática da civilização coloca para a Escola, a fim de que esta forme o novo cidadão? Como a Escola vai traduzir no seu e pelo seu trabalho essa problemática? Estas são as questões fundamentais da nova organização do trabalho na Escola. 

As escolas, partícipes da mesma problemática civilizatória, não são, entretanto, iguais. Por isso, não se trata de encontrar uma única forma nova de organizar o trabalho nela. É importante não nos embrenharmos por esse risco apriorístico essencialista de chegar-se a um modelo universal. Isto não dá conta dos novos problemas atuais. A história da Pedagogia já o demonstrou. No entanto, a história recente também nos mostra que é possível definirem-se alguns princípios norteadores para essa organização nova, sobre os quais já há certo consenso entre os educadores estudiosos do tema. São eles: o projeto político-pedagógico, o trabalho coletivo e o conhecimento da ciência pedagógica.

O Projeto Político-Pedagógico

O projeto político-pedagógico resulta da construção coletiva dos atores da Educação Escolar. Ele é a tradução que a Escola faz de suas finalidades, a partir das necessidades que lhe estão colocadas, com o pessoal - professores/alunos/equipe pedagógica/pais – e com os recursos de que dispõe.

Esses elementos todos são mutáveis, modificam-se de ano para ano, no mesmo ano; de Escola para Escola, na mesma Escola.

Por isso, o projeto não está pronto, mas em construção. Nele, a equipe vai depurando, explicitando, detalhando a inserção dessa Escola na transformação social. 

O projeto político-pedagógico ganha consistência e solidez à medida que vai captando sistematicamente a realidade na qual se insere. Daí ser a realização contínua de diagnósticos dessa realidade um instrumental importantíssimo nessa construção. Diagnóstico aberto, que não se cristaliza e que não se encerra na constatação da realidade, mas que a lê e a Interpreta - o que supõe conhecimento/posicionamento teórico/prático da equipe. Esse trabalho com o diagnóstico - os dados - serão definidor/redefinidor do conteúdo/forma do projeto político-pedagógico da Escola.

O Trabalho Coletivo

O resultado que a Escola pretende - contribuir para o processo de humanização do
aluno-cidadão consciente de si no mundo, capaz de ler e interpretar o mundo no qual está
e nele inserir-se criticamente para transformá-lo - não se consegue pelo trabalho parcelado e fragmentado da equipe escolar, mas sim com o trabalho coletivo. Neste há a contribuição de todos no todo e de todos no de cada um. A especialização de um não é somada à especialização de outro, mas ela colabora com e se nutre da especialização do outro, visando a e por causa de finalidades comuns.

O trabalho coletivo tem sido apontado por pesquisadores e estudiosos como o caminho
mais profícuo para o alcance das novas finalidades da Educação Escolar, porque a
natureza do trabalho na Escola -que é a produção do humano - é diferente da natureza do
trabalho em geral na produção de outros produtos. 

No entanto, reconhece-se, de um lado, que o trabalho coletivo não é tarefa simples, uma vez que a Humanidade, durante séculos e séculos em sua história, acostumou-se a formas de vida individualistas. De outro lado, o coletivo carrega uma contradição que precisa ser explorada. Forjada no modo de produção capitalista, a cooperação - inerente ao coletivo - é, conforme HYPOLITO (1991, p. 18), fundamental para que o trabalho da Escola se realize de acordo com os objetivos "(...) mas esta realidade é contraditória, pois se a cooperação pode ser um fator de estabilidade para o poder, ao mesmo tempo a reunião dos trabalhadores coletivos possibilita uma unidade de interesses e favorece formas de resistência à dominação".

Complexidade da Organização Escolar

A(s) escola(s) é(são) múltipla(s), conjuntos, sistemas - o que requer competências administrativas para traduzir essa complexidade dos sistemas em benefício ao atendimento da finalidade que a Escola tem. Contudo, a Escola em si é complexa. A -finalidade que busca não é simples de ser conseguida. Precisa da contribuição de vários profissionais especializados - professores/equipe pedagógica/direção/coordenação/orientação/equipe de apoio. A organização da Escola é competência de todos - dentro e fora da sala de aula. 

A sala de aula é determinada pelo que a circunda para além de suas paredes - e, em certa medida, interfere para além de suas paredes. Como é durante a aula que se dá a essência da Educação Escolar, é para ela que devem convergir as várias competências dos profissionais da Escola - o que não significa que todos atuarão na sala de aula!; o que não significa, também, que nela só atuam os professores!; o que não significa, também, que os professores só atuam ali!; nem que as equipes pedagógicas e de apoio só atuam fora dali!; nem que aí só elas atuam. 

Enfim, a organização da Escola é coletiva - requer o concurso de especialistas que atuem coletivamente.


A Ciência Pedagógica - Professores e Pedagogos

Com SUCHODOLSKI (1979, p. 477), afirmamos que "o conhecimento da ciência pedagógica é imprescindível, não porque esta contenha diretrizes concretas válidas para hoje e para amanhã; mas porque permite realizar uma autêntica análise crítica da cultura pedagógica, o que facilita ao professor debruçar-se sobre as dificuldades concretas que encontra em seu trabalho, bem como superá-las de maneira criadora".

Entendendo-a como não-exclusiva de pedagogos, é possível afirmar que é tarefa da equipe pedagógica trazer a ciência pedagógica para o trabalho coletivo. Entendendo, ainda, que o coletivo não significa "todos fazerem a mesma coisa", é possível identificar competências específicas da equipe pedagógica: a administração e a coordenação pedagógica de curso, período, turmas, áreas, projetos etc. É interessante observar que, colocadas nesta seqüência, as tarefas de coordenação evidenciam a possibilidade de algumas delas serem desempenhadas por pedagogos - coordenação de curso, de períodos - e outras por professores - coordenação de turmas, período, áreas. Já a coordenação de projetos não é possível ser estabelecida a priori; ela depende do projeto.

Entendendo, ainda, que os conhecimentos pedagógicos têm sido desenvolvidos explícita, intencional e sistematicamente nos cursos de Pedagogia que formam pedagogos, a presença destes na Escola é imprescindível como forma de trazer os conhecimentos pedagógicos necessários para a Escola. Seja nas tarefas de administração – entendida como organização racional do processo de ensino e garantia da perpetuação deste nos sistemas, de forma a consolidar um projeto político-pedagógico de Educação Escolar -, seja nas tarefas que colaborem com os professores no ato de ensinar de modo que os alunos aprendam.

Traduzindo as Competências da Equipe Pedagógica

Retornando às finalidades da Educação Escolar, explicitadas no item Finalidade da Educação Escolar - O "Novo Cidadão", vamos dizer que o eixo central articulador do trabalho coletivo da equipe escolar é traduzir os conhecimentos, as habilidades e as atividades necessários à formação do novo cidadão. Portanto, a consecução do projeto político-pedagógico precisa ser planejada, organizada, explicitando-se contínua e sistematicamente o quê - os conteúdos do trabalho escolar -, o porquê - a quais necessidades se articulam -, como fazer - projetos, cursos etc. -, quem faz - as responsabilidades, as competências -, quando, como etc. É trabalho para muitos.

Vejamos algumas tarefas pelas quais a equipe pedagógica pode ser responsabilizada:

• coordenar e subsidiar a elaboração dos diagnósticos da realidade escolar nos vários
níveis;
• coordenar e subsidiar a elaboração, execução e avaliação do planejamento: plano da
Escola; planos de cursos, de turmas, de ensino etc.;
• incentivar e prover condições para a elaboração de projetos de alfabetização, leitura,
visitas, estudo de apoio, orientação profissional, saúde e higiene, informática, ética etc.;
• compor turmas e horários, com critérios que favoreçam o ensino e a aprendizagem;
• capacitar em serviço;

• fornecer assistência didático-pedagógica constante;
• assegurar horários para reuniões coletivas, planejá-las, coordená-las, avaliá-las etc.;
• definir claramente, quanto às reuniões com pais, em que a presença destes é
importante na construção do projeto político-pedagógico, traduzindo essa participação;
• promover a articulação orgânica das disciplinas;
• acompanhar o rendimento escolar dos alunos;
• prever formas de suprir possível defasagem no rendimento escolar do aluno;
• propiciar trabalho conjunto por áreas, por séries etc., para analisar, discutir, estudar,
atualizar, aperfeiçoar as questões pertinentes às áreas, às séries e ao processo
ensino-aprendizagem;
• promover a integração de professores novos na Escola;
• pesquisar causas de evasão, repetência e outras.

Enfim, há muito o que fazer. Nesta tentativa de traduzir a competência da equipe pedagógica, fica claramente evidenciado o significado de trabalho coletivo na Escola - não é possível trabalhar fragmentadamente o objeto do trabalho da Escola, não dá e não é desejável estabelecer fronteiras claramente delimitadas sobre o que compete a quem, mas dá para identificar claramente que este trabalho precisa de competências específicas.

Dificuldades e Entraves

Sem pretender esgotá-las, é possível apontar algumas dificuldades para a acentuação
coletiva do projeto político-pedagógico da Escola. Identificar as dificuldades não significa
parar nelas, mas mapeá-las para vermos com clareza as formas de superá-las.

Uma primeira dificuldade refere-se à formação dos profissionais da Escola. Amplamente
analisada como precária - e até inexistente -, a formação também tem sido apontada como
insuficiente, porque não formou o novo profissional para construir o novo.

Não se trata de mandar os profissionais de volta para a Faculdade, nem de esperar que
esta se modifique para fazer "o novo". Trata-se de retomar a Faculdade - os
conhecimentos, a formação que trabalhou - e confrontá-la com as necessidades que o novo
coloca. Aí, garimpar o aproveitável, fortalecê-lo e ampliá-lo, por meio da atualização
-cursos, bibliografia, estudos, troca e crítica de experiências etc.

Uma segunda ordem de dificuldades diz respeito ao institucional/cultural - sociedade
competitiva, eivada de autoritarismo, de individualismo.

Como fazer diferente se somos marcados por isso tudo? Parece-me que não somos pura e
simplesmente a reprodução mecânica do que fizeram conosco. Ou somos?

Outra ordem de dificuldades concerne aos aspectos pessoais: as convicções e ideologias
arraigadas e cristalizadas; o mito do sucesso pessoal a qualquer preço; a timidez, a falta
de arrojo e de coragem para empunhar bandeiras e lutar por elas...

Todas essas dificuldades são passíveis de serem superadas. A realidade de nossas escolas
está mostrando que sim. Mas não sem sofrimento e luta.


Referências Bibliográficas
• citadas no texto:
HYPOLITO, Álvaro Moreira. Processo de trabalho na escola: algumas categorias para análise. Teoria e Educação, Porto Alegre: Palmarinca, n, 4,1991. (Dossié interpretando o trabalho docente.)
SUCHODOLSKI, Bogdan. Tratando de pedagogia. 4. ed. Barcelona: Península, 1979. 
• não-citadas no texto, mas que o embasam:
MARQUES, Waldernar. O ensino público estadual de 1,2 grau na Grande São Paulo - o ciclo básico em questão. Dissertação (Mestrado) - UNICAMP, 1991.
PIMENTA, Selma Garrido. O pedagogo na escola pública. 2. ed. São Paulo: Loyola, 1991.
SCHMIED, Kowarzik W. Pedagogia dialética. São Paulo: Brasiliense, 1983.
SILVA JR., Celestino Alves. Escola pública como local de trabalho. São Paulo: Cortez, 1991.


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sexta-feira, 27 de abril de 2012

Novo perfil do professor

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quarta-feira, 25 de abril de 2012

Modelos Pedagógicos & Modelos epistemológicos (Fernando Becker)


     Podemos afirmar que existem três diferentes formas de representar a relação ensino/aprendizagem escolar ou mais especificamente, a sala de aula.  Falaremos, inicialmente, de modelos pedagógicos e, na falta de  terminologia mais atualizada, ou adequada, falaremos em pedagogia diretiva, pedagogia não-diretiva e, talvez criando um novo termo, pedagogia relacional. Mostraremos como tais modelos são, por sua vez, sustentados, cada um deles, por determinada epistemologia.  Epistemologia que se mostrou refratária a toda exuberante crítica da sociologia da educação que se desenvolveu no país, do final dos anos 70 até agora.

a)Pedagogia diretiva e seu pressuposto epistemológico

          Pensemos no primeiro modelo. Para configurá-lo é só entrar numa sala de aula: é pouco provável que a gente se engane. O que encontramos aí?  Um professor que observa seus alunos entrarem na sala, aguardando que se sentem, que fiquem quietos e silenciosos.  As carteiras estão devidamente enfileiradas e suficientemente afastadas uma da outra para evitar que os alunos troquem conversas. Se o silêncio e a quietude não se fizerem logo, o professor gritará para um aluno, xingará outra aluna até que a palavra seja monopólio seu. Quando isto acontecer, ele começará a dar a aula.
     Como é esta aula?  O professor fala e o aluno escuta.  O professor dita e o aluno copia.  O professor decide o que fazer e o aluno executa.  O professor ensina e o aluno aprende.  Se alguém observasse uma sala de aula na década de 60 ou de 50, ou, quem sabe, de dois séculos atrás, diria, provavelmente, a mesma coisa: falaria  como Paulo Freire, no Pedagogia do Oprimido. Por que o professor age assim?  Muitos dirão, porque ele aprendeu que é assim que se ensina. Para mim, esta resposta é correta, mas não é suficiente. Então, por que mais? Penso que o professor age assim porque ele acredita que o conhecimento  pode ser transmitido para o aluno.   Ele acredita no mito da transmissão do conhecimento  - do conhecimento enquanto forma ou estrutura; não só enquanto conteúdo.  O professor  acredita, portanto, numa determinada  epistemologia, isto é, numa “explicação”, ou, melhor, crença da gênese e do desenvolvimento do conhecimento, “explicação” da qual ele não tomou consciência e que, nem por isso, é menos eficaz.  Diz um professor (Becker, 1992): O conhecimento  “se dá à medida que as coisas vão aparecendo e sendo introduzidas por nós nas crianças...”.  Outro professor  diz: O conhecimento  “é transmitidos, sim; através  do meio-ambiente, família, percepções, tudo”.  Outro, ainda: o conhecimento se dá “na medida em que a pessoa é estimulada, ela é perguntada, ela é incitada, ela é questionada , ela é, até, obrigada a dar uma resposta...”.
     Como se configura  esta epistemologia?
     Falemos, como na linguagem epistemológica, em sujeito e objeto.  O sujeito é o elemento conhecedor, o centro do conhecimento.  O objeto é tudo o que o sujeito não é. O que é o não-sujeito? – o mundo onde ele está mergulhado; isto é, o meio físico e/ou social.  Segundo a epistemologia que subjaz à prática desse professor, o indivíduo, ao nascer, nada tem em termos de conhecimentos: é uma folha de papel em branco; uma tábula rasa. É assim o sujeito na visão epistemológica desse professor: uma folha em branco.  Então, de onde vem o seu conhecimento (conteúdo) e a sua capacidade de conhecer (estrutura)? Vem do meio físico e/ou social.  Empirismo é o nome desta  explicação da gênese do desenvolvimento do conhecimento.   Sobre tábula rasa, segundo a qual “não há nada no nosso intelecto que não tenha entrado lá através dos nossos sentidos”, diz Papper (1991): “Essa idéia não é simplesmente errada, mas grosseiramente errada...” (p.160).  Voltemos ao professor na sala de aula.
     O professor considera que seu aluno é tábula rasa somente quando ele nasceu como ser humano, mas frente a um novo conteúdo estocado na sua grade curricular, ou nas gavetas de sua disciplina.  A atitude, nós a conhecemos. O alfabetizador considera que seu aluno nada sabe em termos de leitura e escrita e que ele tem que ensinar tudo.  Mais adiante, frente à aritmética, o professor, novamente, vê seu aluno como alguém que nada sabe sobre somas e subtrações. No segundo grau, numa aula de física, o professor vai tratar seu aluno como alguém sem nenhum saber sobre espaço, tempo, relação causal.  Já na universidade, o professor e matemática olha para seus alunos, no primeiro dia de aula, e “pensa”:  “60% já está reprovado!” Isto porque ele os concebe, não apenas como folha em branco na matemática que ele vai ensinar, mas, por causa da sua concepção epistemológica, como estruturalmente incapazes de assimilar esse saber.
     Como se vê, a ação desse professor não é gratuita.  Ela é legitimada, ou fundada teoricamente, por uma epistemologia.  Segundo esta, o sujeito é totalmente determinado pelo mundo do objeto ou meio físico e social.  Quem representa este mundo, na sala de aula, é, por excelência, o professor.  No seu imaginário, ele, e somente ele, pode produzir algum novo conhecimento no aluno.  O aluno aprende se, e somente se, o professor ensina.  O professor acredita no mito da transferência do conhecimento: o que ele sabe, não importa o nível de abstração ou de formalização, pode ser transferido ou transmitido para o aluno.  Tudo o que o aluno tem a fazer é submeter-se à fala do professor: ficar em silêncio, prestar atenção, ficar quieto e repetir  tantas vezes quantas forem necessárias, escrevendo, lendo, etc... até aderir em sua mente, o que o professor deu.
     Como se vê, esta pedagogia, legitimada pela epistemologia empirista, configura o próprio quadro da reprodução do autoritarismo, da coação, da heteronomia, da subserviência, do silêncio, da morte da crítica, da criatividade, da curiosidade.  Nessa sala de aula, nada de novo acontece; velhas perguntas são respondidas com velhas respostas.  A certeza do futuro está na reprodução pura e simples do passado. A disciplina escolar que tantas vítimas já produziu é exercida com todo rigor, sem nenhum sentimento de culpa, pois há uma epistemologia, uma psicologia (da qual não falamos aqui) e uma pedagogia que a legitimam.  O aluno, egresso dessa escola, será bem recebido no mercado de trabalho, pois aprendeu a silenciar, mesmo discordando, perante a autoridade do professor, a não reivindicar coisa alguma, a submeter-se e a fazer um mundo de coisas sem sentido, sem reclamar.  O produto pedagógico acabado dessa escola é alguém que renunciou ao direito de pensar e que, portanto, desistiu de sua cidadania e do direito ao exercício da política no seu mais pleno significado: qualquer projeto  que vise a alguma transformação social escapa a seu horizonte, pois ele deixou de acreditar que sua ação seja capaz de qualquer mudança.  O cinismo é seu jargão.


b) Pedagogia não-diretiva e seu pressuposto epistemológico

     Pensemos no segundo modelo.  Não é fácil detectar sua presença.  Ela está mais nas concepções pedagógicas e epistemológicas do que na prática porque esta é difícil de viabilizar.  Pensemos, então, como seria a sala de aula de acordo com esse modelo.  O professor é um auxiliar do aluno, um facilitador (Carl Rogers).  O aluno já traz um saber que ele precisa, apenas, trazer à consciência, organizar, ou, ainda, rechear de conteúdo.  O professor deve interferir o mínimo possível.  Qualquer ação que o aluno decida fazer é, a priori, boa, instrutiva.  É o regime do laissez-faire: “deixa fazer” que ele encontrará o seu caminho.  O professor deve policiar-se  para interferir o mínimo possível.  Qualquer semelhança com a “liberdade de mercado” do neo-liberalismo é mais do que coincidência.
     O professor não-diretivo acredita que o aluno aprende por si mesmo.  Ele pode, no máximo auxiliar a aprendizagem do aluno, despertando o conhecimento que já existe no aluno. Ensinar? Nem pensar! Ensinar prejudica o aluno.  Como diz um professor (Becker, 1992): “Ninguém pode transmitir.  É o aluno que aprende”. Outro professor afirma: “Tu não transmite o conhecimento.  Tu oportuniza, propicia, leva a pessoa a conhecer”.  Outro, ainda: “...acho que ninguém pode ensinar ninguém: pode tentar transmitir, pode tentar mostrar... acho que a pessoa aprende praticamente por si...”. Que epistemologia sustenta esta modelo pedagógico?
     A epistemologia que fundamenta essa postura pedagógica é a apriorista. “Apriorismo” vem de a priori, isto é, aquilo que é posto antes como condição do que vem depois. O que é posto antes?  A bagagem hereditária.  Esta epistemologia acredita que o ser humano nasce com o conhecimento já programado na sua herança genética.  Basta um mínimo de exercício para que se desenvolvam ossos, músculos e nervos e assim a criança passe a postar-se ereta, engatinhar, caminhar, correr, andar de bicicleta... assim também com o conhecimento.  Está tudo previsto.  É suficiente proceder a ações para que tudo aconteça em termos de conhecimento.  A interferência do meio físico ou social – deve ser reduzida ao mínimo.   É só pensar no Emílio de Rousseau ou nas crianças de Summerhill (Snyders, 1974).  As ações espontâneas farão a criança transitar por fases de desenvolvimento , cronologicamente fixas, que são chamadas de “estágios” e que são, freqüentemente, confundidos com os estágios da Epistemologia Genética piagetiana: nesta, os estágios são, ao contrário, cronologicamente, variáveis.  Voltemos ao papel do professor.
     O professor, imbuído de uma epistemologia apriorista – inconsciente, na maioria das vezes – renuncia àquilo que seria a característica fundamental da ação docente: a intervenção no processo de aprendizagem do aluno.  Ora, o poder que é exercido  sem reservas, com legitimidade epistemológica no modelo anterior , é aqui escamoteado.  Ora, a trama de poder, em qualquer  ambiente humano, pode ser disfarçada, mas não eliminada.  Acontece que, na escola, há limites disciplinares intransponíveis.  O que acontece, então, com o pedagogo não diretivo?  Ou ele arranja uma forma mais “subliminar” de exercer o poder ou ele sucumbe.  Freqüentemente, o poder exercido deste modo assume formas mais perversas que na forma explícita do modelo anterior.
     Assim como no regime da “livre iniciativa” ou de “liberdade de mercado” o estado aumenta  seu poder para garantir a continuidade e, até, o aumento dos privilégios da minoria rica utilizando, não a perseguição política, mas a expropriação dos salários e a desmoralização das instituições representativas dos trabalhadores, assim também, por mecanismos indiretos exerce-se, por vezes, numa sala de aula não-diretiva, um poder tão predatório como o da sala de aula diretiva.  Por isso, Celma (1979) afirma que os alunos tinham pavor de sua professora não-diretiva.
     Como vimos, uma pedagogia desse tipo não é gratuita.  Ela tem legitimidade teórica: extrai sua fundamentação da epistemologia apriorista.  O professor parece, no entanto, não tomar consciência disso.  Esta mesma epistemologia, que concebe o ser humano como dotado de um saber “de nascença”, conceberá, também, dependendo das conveniências, um ser humano desprovido  da mesma capacidade, “deficitário”. Este  “déficit”, porém, não tem causa externa: sua origem é hereditária.  Onde se detecta maior incidência de dificuldades ou retardos de aprendizagem? Entre os miseráveis, o mal-nutridos, os pobres, os marginalizados... Está,  aí, a teoria da carência cultural para garantir a interpretação de que marginalização econômico-social e “déficit” cognitivo são sinônimos. A criança marginalizada, entregue a si mesma, numa sala de aula não-diretiva, produzirá, com alta probabilidade, menos, em termos de conhecimento, que uma criança de classe média ou alta.  Trata-se, aqui, de acordo com o apriorismo, de “deficit” herdado: epistemologicamente legitimado,  portanto.


c) Pedagogia relacional e seu pressuposto epistemológico

     O professor e os alunos entram na sala de aula.  O professor traz algum material – algo que, presume, tem significado para os alunos.  Propõe que eles explorem este material  cuja natureza depende do destinatário: crianças de pré-escola, de primeiro grau, de segundo grau, universitário, etc. Esgotada a exploração do material, o professor dirige um determinado número de perguntas, explorando, sistematicamente, diferentes aspectos problemáticos a que o material dá lugar.  Pode solicitar, em seguida, que os alunos representem desenhando, pintando, escrevendo, fazendo cartunismo, teatralizando, etc... o que elaboram.  A partir daí, discute-se a direção, a problemática, o material da(s) próxima(s) aula(s).
     Por que o professor age assim? Porque ele acredita que o aluno só aprenderá alguma coisa, isto é, construirá algum conhecimento novo, se ele agir e problematizar a sua ação. Em outras palavras, ele acredita que há duas condições necessárias para que algum conhecimento novo seja construído: a) que o aluno aja (assimilação) sobre o material que o professor presume que tenha algo de cognitivamente interessante, ou melhor, significativo para o aluno; b) que o aluno responda para si mesmo às perturbações (acomodação) provocadas pela assimilação desse material, ou, que o aluno se aproprie, neste segundo momento, não mais do material, mas dos mecanismos íntimos de suas ações sobre este material; este processo far-se-á por reflexionamento e reflexão (Piaget, 1977), a partir das questões levantadas pelos próprios alunos e das perguntas levantadas pelo professor, e de todos os desdobramentos que daí ocorrerem.  O professor não acredita no ensino em seu sentido convencional ou tradicional, pois não acredita que um conhecimento (conteúdo) e uma condição prévia de conhecimento (estrutura) possa passar, por força do ensino, da cabeça do professor para a cabeça do aluno.  Não acredita na tese de que a mente do aluno é tábula rasa, isto é, que o aluno, frente a um conhecimento novo, seja totalmente ignorante e tenha que aprender tudo da estaca zero, não importa o estágio do desenvolvimento em que se encontre.  Ele acredita que tudo o que o aluno construiu até hoje em sua vida serve de patamar para continuar a construir  e que alguma porta abrir-se-á para o novo conhecimento é só questão de descobri-la; ela a descobre por construção. “Aprender é proceder a uma síntese indefinidamente renovada entre a continuidade e a novidade” (Inhelder et al... 1977 p.263): aprendizagem é, por excelência, construção: ação e tomada de consciência da coordenação das ações, portanto. Professor e aluno determinam-se mutuamente.  Como vemos, a epistemologia deste professor mostra diferenças fundamentais com relação às anteriores.  Como se configura ela?
     O professor tem todo um saber construído, sobretudo numa determinada direção do saber formalizado. Este professor, que age segundo o modelo pedagógico relacional, professa uma epistemologia também relacional.  Ele concebe a criança (o adolescente, o adulto) seu aluno, como tendo uma história de conhecimento já percorrida: a aprendizagem da língua materna é um fenômeno que absolutamente não pode ser subestimado; eu ousaria dizer que a criança que fala uma língua tem condições, respeitado o nível de formalização, de aprender qualquer coisa.  Aliás, o ser humano, ao nascer, não é uma tábula rasa.  Antes, ao contrário, ele traz uma herança biológica que é o oposto da “folha de papel em branco”.  Diz Papper, lembrando que a afirmação de que “nada há no intelecto que não tenha passado primeiramente pelos sentidos é grosseiramente errada:” “Basta que nos lembremos dos dez milhões de neurônios do nosso córtex cerebral, alguns deles (as células piramidais do córtex) cada um com um total estimado em dez mil sinapses” (p.160). Para Piaget, mentor por excelência de uma epistemologia relacional, não se pode exagerar a importância do meio social.
     O que ele rejeita, no entanto, é a crença de que a bagagem hereditária já traz, em si, programados os instrumentos (estruturas) do conhecimento e segundo a qual bastaria o processo de maturação para estes instrumentos manifestarem-se em idades previsíveis, segundo estágios cronologicamente fixos (apriorismo).  Rejeita, de outro lado, que a simples  pressão do meio social sobre o sujeito determinaria nele, mecanimente, as estruturas do conhecer (empirismo). Para Piaget, o conhecimento tem início quando o recém-nascido age assimilando alguma coisa do meio físico ou social.  Este conteúdo assimilado, ao entrar no mundo do sujeito, provoca, aí, perturbações, pois traz consigo algo novo para o qual a estrutura assimiladora não tem instrumento.  Urge, então, que o sujeito refaça seus instrumentos de assimilação em função da novidade.  Este refazer do sujeito sobre si mesmo é a acomodação.  É este movimento, esta ação que refaz o equilibrio perdido: porém, o refaz em outro nível, criando algo novo no sujeito.  Este algo novo fará com que as próximas assimilações sejam diferentes das anteriores, sejam melhores: equilibração majorante, isto é, o novo equilíbrio é mais consistente que o anterior.  O sujeito constrói, daí, construtivismo seu conhecimento em duas dimensões complementares, como conteúdo e como forma e estrutura: como conteúdo ou como condição prévia de assimilação de qualquer conteúdo.
     No mundo interno (endógeno) do sujeito, algo novo foi criado.  Algo que é síntese do que existia, antes, como sujeito originariamente, da bagagem hereditária e do conteúdo que é assimilado do meio social.  O sujeito cria um outro, dentro dele mesmo, que não existia originariamente.  E cria-o por força de sua ação (assimiladora e acomodadora).  A ação do sujeito, portanto, constitui, correlativamente, o objeto e o próprio sujeito.  Sujeito e objeto não existem antes da ação do sujeito.  A consciência não existe antes da ação do sujeito.  Porque a consciência é, segundo Piaget, construída pelo próprio sujeito na medida em que ele se apropria dos mecanismos íntimos de suas ações, ou melhor dito, da coordenação de suas ações.  Este processo construtivo não tem fim e nem começo absoluto.  Ele pode ser aplicado por outro prisma teórico, também de Piaget.  A teoria da abstração reflexionante, uma teoria explicativa que é mais competente que a teoria da equilibração para explicar o que acontece ao nível das trocas simbólicas, ao nível da “manipulação” dos símbolos, das  relações sociais e não só ao nível da manipulação dos objetos do mundo físico com sua gama interminável de aspectos exploráveis.  Deixemos, no entanto, a teoria da abstração já referida acima para outra ocasião (cf. Becker, 1993).
     O professor acredita que seu aluno é capaz de aprender sempre.  Esta capacidade precisa, no entanto, ser vista sob duas dimensões, entre si complementares.  A estrutura, ou condição prévia de todo o aprender, que indica a capacidade lógica do aluno e o conteúdo.  Lembremos que para Piaget (1967) a estrutura é orgânica antes de ser formal. A dinamização ou dialetização do processo de aprendizagem exige, portanto, dupla atenção do professor. O professor, além de ensinar, precisa aprender o que seu aluno já construiu até o momento, condição prévia das aprendizagens futuras. O aluno precisa aprender o que o professor tem a ensinar (conteúdos da cultura formalizada, por exemplo); isto desafiará a  intencionalidade de sua consciência (Freire, 1979) ou provocará um desiquilíbrio (Piaget, 1936:1967) que exigirá do aluno respostas em duas dimensões complementares: em conteúdo e em estrutura.  Para Freire, o professor, além de ensinar, passa a aprender; e o aluno, além de aprender, passa a ensinar.  Nesta relação o professor e alunos avançam no tempo.  As relações de sala de aula, de cristalizadas com toda a dose de monotonia que as caracteriza – passam a ser fluídas.  O professor construirá, a cada dia, a sua docência, dinamizando seu processo de aprender.  Os alunos construirão, a cada dia, a sua discência, ensinando aos colegas e ao professor novas coisas.  Mas o que avança  mesmo neste processo é a condição prévia de todo aprender ou de todo o conhecimento, isto é, a capacidade construída de construir sempre mais e novos conhecimentos.
     A tendência, nessa sala de aula, é a de superar, por um lado, a disciplina policialesca e a figura autoritária do professor que a representa, e, por outro, a de ultrapassar o dogmatismo do conteúdo.  Não se trata de instalar um regímen de anomia (ausência de regras ou leis de convivência) ou do laissez-faire, nem de esvaziar o conteúdo curricular: estas coisas são características do segundo modelo pedagógico com o qual confunde-se, freqüentemente, uma proposta construtivista.  Trata-se, antes, de criticar radicalmente, a disciplina policialesca e construir uma disciplina intelectual ou regras de convivência, o que permite criar um ambiente fecundo de aprendizagem.  Trata-se, também, de recriar cada conhecimento que a humanidade já criou (pois não há outra forma de entender-se a aprendizagem segundo a psicologia genética piagetiana, só se aprende o que é (re)criado para si e, sobretudo, de criar conhecimentos novos: novas respostas para antigas perguntas e novas perguntas refazendo antigas respostas e, não em última análise, respostas novas para perguntas novas.  Trata-se, numa palavra, de construir o mundo que se quer  e não de reproduzir/repetir o mundo que os antepassados construíram para eles ou herdaram de seus antepassados.


     O resultado desta sala de aula é a construção e a descoberta do novo é a criação de uma atitude  de busca e de coragem que esta busca exige. Esta sala de aula não reproduz o passado pelo passado, mas debruça-se sobre o passado porque aí se encontra o embrião do futuro. Vive-se intensamente o presente na medida em que se constrói o futuro buscando no passado sua fecundação.  Dos escombros do passado delineia-se o horizonte do futuro: origina-se, daí, o significado que dá plenitude ao presente. Para quem pensa que estou desenhando um mar de rosas, alerto que para grande número de indivíduos configura-se como extremamente penoso mexer no passado.  Como diz a mãe de um menino de rua: para que vou lembrar o passado se ele não tem nada de bom? Aqui, os conceitos, muito próximos entre si, de tomada de consciência de Piaget e de conscientização de Freire são excepcionalmente fecundos para dialetizar o processo passado-presente-futuro.  A convicção que a epistemologia genética nos traz é a de que este é o caminho para jogar-se para o futuro, para adiantar-se aos acontecimentos.  Para não andar a reboque da história, mas para fazer história, para ser sujeito, portanto.

Considerações finais

          Em nossas pesquisas, ou em observações informais, detectamos o seguinte comportamento: professores que participavam de greve do magistério público estadual ou federal, como “militantes progressistas”, mostrando compreensão, a nível macro, do que acontecia na economia e na política, ao retornar à sala de aula (nível micro), após o término da greve, voltavam a ser  professores plenamente sintonizados com o modelo A. Sua crítica sociológica, freqüentemente lúcida, exercida, via de regra, segundo parâmetros marxistas, mostrava-se incapaz de atingir sua ação docente (prática), nem atingia seu modelo pedagógico (teoria). Por quê?
     Não se desmonta um modelo pedagógico arcaico somente pela crítica sociológica, por mais importante que seja esta.  Segundo nossa hipótese, a desmontagem de um modelo pedagógico só pode ser realizada completamente pela crítica epistemológica.  Em outras palavras, a crítica epistemológica é insubstituível para a superação de práticas pedagógicas fixistas, reprodutivistas, conservadoras, sustentadas pelas epistemologias empirista ou apriorista.  Note-se que estas epistemologias fundam, por um lado, o positivismo e, de forma menos fácil, de mostrar o neo-positivismo, e, por outro, o idealismo ou o racionalismo.
     Pensamos, também, que a formação docente precisa incluir, cada vez mais, a crítica epistemológica.  Nossa pesquisa sobre a epistemologia do professor (Becker, 1992) mostrou o quanto esta crítica está ausente e quanto o seu primitivismo conserva o professor prisioneiro de epistemologias do senso comum, tornando-os incapazes de tomar consciência das amarras que aprisionam seu fazer e seu pensar.
     Pudemos experienciar o quanto de fecundidade teórico-crítica, aliás inesgotável, a epistemologia genética piagetiana possibilita.  O pensamento de Paulo Freire tem mostrado, em alguns momentos, uma fecundidade similar, em termos pedagógicos; mas também em termos epistemológicos (cf. Andreola, 1993).
     Uma proposta pedagógica, dimensionada, pelo futuro que vislumbramos, deve ser construída pelo poder constitutivo e criador da ação humana “é a ação que dá significado as coisas!” Mas não a ação aprisionada:  aprisionada pelo treinamento, pela monotonia mortífera da repetição, pela predatória imposição autoritária. Mas, sim a ação que, num primeiro momento realiza os desejos humanos, suas necessidades e, num segundo momento,  apreende simbolicamente o que aprendeu no primeiro momento: não só assimilação, mas assimilação e acomodação; não só reflexionamento, mas reflexionamento e reflexão; não só ação de primeiro grau , mas ação de primeiro e de segundo graus e de enésimo grau; numa palavra, não só prática , mas prática e teoria.  A acomodação, a reflexão, as ações de segundo grau e a teoria retroagem sobre a assimilação, o reflexionamento, as ações de primeiro grau e a prática, transformando-os.  Poder-se-á, assim, enfrentar o desafio de partir da experiência do educando, recuperando o sentido do processo pedagógico, isto é, recuperando e (re)constituindo o próprio sentido do mundo do educando... e do educador.
     Uma proposta pedagógica relacional visa a sugar o mundo do educando para dentro do mundo conceitual do educador.  Este mundo conceitual do educador sobre perturbações, mais ou menos profundas, com a assimilação deste conteúdo novo.  A alternativa é: responder ou sucumbir.  A resposta abre um mundo novo de criações.  A não resposta condena o professor às velhas fórmulas que descrevemos acima.  A condição para que o professor responda, está, como vimos, numa crítica radical não só de seu modelo pedagógico, mas de sua concepção epistemológica.
     Para enfrentar este desafio, o professor deveria responder, antes, a seguinte questão: que cidadão ele quer que seu aluno seja? Um indivíduo subserviente, dócil, cumpridor de ordens sem perguntar pelo significado das mesmas, ou um indivíduo pensante, crítico, que, perante cada nova encruzilhada prática ou teórica, pára e reflete, perguntando-se pelo significado de suas ações futuras e, progressivamente, das ações do coletivo onde se insere? Esta parece-me, é a pergunta fundamental que permite iniciar o processo de restauração do significado e da construção de um mundo de significações futuras.

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