O jovem professor, com o tempo, chegará a uma resposta.E não é resposta que se ensina, e sim aprende vivenciando e questionando sempre. É uma resposta pessoal, dele, e apesar de me deixar com a língua coçando, me contive
Fomos embora e nocaminho de casa fui pensando . . .As pessoas querem encontrar algum sentido no trabalho, porque é aí que passam a maior parte de seus dias.Será que esse sentido foi abalado nos profissionais da Educação?
Segundo o sociólogo Richard Sennett, " As transformações econômicas estão tirando da vida das pessoas coisas importantes como a lealdade, compromisso, solidariedade e, se você olha de fora e examina a situação de um ponto de vista material, parece que as pessoas nunca estiveram tão bem no trabalho " ,
Mostrando o que está por trás das aparências,Sennett, "afirma que as pessoas estão pagando um preço alto para sobreviver na nova economia que é confusa, insegura e depressiva para as pessoas que trabalham nela."
A falta de uma política educacional séria, sem influência de modismos, que valorize a opinião dos professores – que é quem realmente coloca "a mão na massa" - , e os vários projetos das Secretarias de Educação, que caem de pára-quedas nas escolas, sendo um instrumento que tem a finalidade única de publicidade de governos para fins eleitorais , levaram os educadores a visualizarem o governo como uma instituição que não tem compromisso de priorizara busca de uma Educação de qualidade. Sendo os discursos e suas práticas em sua maioria demagoga.
Não sendo valorizado (e não digo só no salário), a motivação do funcionário despencou.
Serão os professores culpados pela baixa qualidade na Educação brasileira ?
O que vemos nas matérias jornalísticas veiculadas nacionalmente é que sempre concluem que o culpado é o professor, que não sabe dar aulas criativas ( pois se tem toda a estrutura escolar favorável a isso, não o faz por irresponsabilidade), que nuncaquer se aperfeiçoar ( pois tem tempo de sobra para isso), e a última,que a evasão escolar e o nível precário de aprendizagem é culpa também desse professor.
Coitado !Virou agora "bode expiatório"E nem tente se justificar !É você o culpado e ponto final.Assim, com a mídia a anos ajudando a desmoralizar e desvalorizar a função de professor junto a sociedade, tem como não se sentir triste e angustiado ?
Nunca lembram de cobrar a responsabilidade das outras instâncias de poder, família, e dos governos, pois este sim éque tem todo o poder e o controle das decisõesno setor educacional.
O trabalho alienante do professor, aonde ele se sente uma mera peça no processo produtivo,faz sentir o trabalho como obrigação de sobrevivência e menos prazeroso.
Nossoprazer está em ensinar servindo de orientação as novas gerações, apesar de tantas dificuldades.Acredito que se a sociedade soubesse que apesar de todas as dificuldades, conseguimos ainda ensinar nossos jovens, ela nos veria como heróis nacionais.
Numa sociedade, que a educaçãoé voltada para investimentos decurto prazo, é difícil os governantes perseguirem objetivos de longo prazo ( não traz votos ), temos que aprender como fizeram os países de Cuba, Uruguai, Costa Rica e Coréia do Sul, que pensam o acesso e a permanência de alunos na escola como uma política de Estado e que apostaram na Educação pública, fazendo investimentos educacionais de longo prazo e com metas e regras claras para a sociedade.
É preciso que o educador entenda que suas queixas, têm nome e endereço completo, e é preciso ter uma visão do todo, contextualizando sempre, para não se cometer injustiças contra si mesmo e seus colegas de trabalho, ou seja, julgando e sendo julgado.
O professor e pesquisador argentino Gustavo Fischman contribui para a nossa reflexão com as seguintes palavras:
" Nos anos 80 e 90, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional( FMI ) --agências da ONU, forçaram políticas de ajustes econômicos que tiveram grande efeito sobre a Educação na América Latina. Os planos implicavam, em muitos casos, condicionar créditos financeiros a mudanças no sistema educacional dos países. O Banco Mundial achava que investir no ensino fundamental era muito mais produtivo ( para o sistema econômico capitalista ) do que no universitário. Hoje o banco reconhece que essa política se baseava em pesquisas insuficientes. Mudou-se toda uma política de Educação na América Latina a partir de um modelo que não era sólido."
A nossa LDB, Lei N.º 9.394/1996 foi elaborada sob a influência deste contexto mundial.
Os professores, com certeza lembram da angústia que tivemos na implantação do Regime de Progressão Continuada no Ensino Fundamental, resolução N.º 8086/1997 em Minas Gerais, que caiu de pára-quedas em nossa cabeça, com o conhecido manual "Ciclos de Formação Básica", pondo fim a reprovação, sendo o aluno automaticamente promovido nos Ciclos; lembram da pressão da Secretaria de Educação, através de suas superintendências por aprovação de alunos que os relatórios das supervisoras e professoras apontavam com deficiência na aprendizagem, e que não eram aceitos como justificativa de retenção pela Secretaria.
Lembram da criação do cargo de Especialista, juntando orientador e supervisor no mesmo "pacote"? Sabíamos que o motivo era, de novo, ocontrole de gastos. Querem fazer uma educação nacional de qualidade, gastando pouco dinheiro. Isso não é possível, não se pode medir esforços e brincar com a formação intelectual de nossas crianças e jovens. Este sim é um investimento nobre para o Brasil, que deveriam todos acreditar.
Lembram do "Projeto Acertando o Passo", que sem respeitar o ritmo dos alunos, também acelerou a queda nas taxas de reprovação.
Lembram da exigência da LDB de presença mínima de 75% a ser computada no final de cada ciclo ( 3 anos ), que sabíamos de difícil operacionalização e que seria uma ação prejudiciale desmotivadora nos alunos.
Aqueles momentos de angústia, aonde os professores se sentiam ignorados em sua experiência, se refletem até hoje.
Vamos lembrar, agora,da cronologia de alguns fatos que originaram essas políticas desastrosas :
·Em Março de 1990 aconteceu a "Conferência Mundial sobre Educação para Todos", realizado em Jomtiem, Tailândia e na seqüência outro encontro na Unicef House, New York, USA em 1991.Desses encontros foram tiradas pela ONU diversas declarações, que culminaram nas Normas Uniformes para a Educação, que orientaram as mudanças nos sistemas educacionais dos países da América do Sul.
·A Declaração de Salamanca, linha de ação, realizado pela Unesco, na Espanha em 1994.
Os jornais de 1998 lançavam manchetes que mostravam a angústia das escolas em seu cotidiano :"Sem "bomba", indisciplina cresce entre os jovens"Estado de Minas,13/10/98,pág 24;" O que deveria ser uma revolução no ensino se transformou em um grande transtorno para os educadores e gerentes dos sistemas de ensino" , Jornal EM, 11/10/1998, pág. 32,33.
Revistas nacionais também torturavam os professores apoiando a cópia dos modelos educacionais estrangeiros, exaltados como "modernidade", pressionando e sugerindo que os educadores precisavam reciclar suas idéias, ou seja, apoiar o novo modelo de educação para ser moderno.
" A máquina que cospe crianças" – Finalmente o Brasil entendeu que só vai sair da crise quando resolver a tragédia do ensino básico ", assim a Revista Veja, de 20/11/1991, pág46, justificou a necessidade do novo modelo educacional que surgia. Nesta matéria existe a cobrança de investimentos em Educação como os que foram feitos pelos Tigres Asiáticos, fato que me preocupa quando leio na revista veja de 16/02/2005,a seguinte manchete :
" Revolução pela Educação " – " A Coréia fez, o Brasil também pode fazer", e me preocupa ainda mais as propostas dos candidatos nas eleições para presidente de 2006, que defendiam a adoção de modelos estrangeiros, se queremos crescer.
Será que não estamos, de novo, acreditando em idéias salvadoras e em modelos educacionais que servem aquela realidade específica, e abrindo mão de pensar o nosso modelo de Educação nacional, que leve em consideração a opinião de todos que participam no processo educativo ? Essa mesma matéria nos alerta "Criança de 6 anos Kang Jim Won chora compulsivamente no meio da sala de aula porque tirou nota vermelha em matemática. " Sou um fracasso ! Desespera-se a menina," continuando, " Pais coreanos preocupados com o excesso de disciplina e cobrança em crianças menores estão mandando seus filhos estudarem no Estados Unidos " , e mais recente, o jovem estudante coreano numa Universidade americana assassinou várias pessoas, e a reportagem afirmava que os pais foram com a família para os E.U.A. ,buscando melhor condição de vida. Fico a pensar... Um país desenvolvido, exemplo de investimento em Educação, em tecnologia, as crianças que estão sendo formadas neste modelo educacional atendem as nossas expectativas ?
O professor de Educação da Universidade de Hanyang, em Seul, Yun-Kyung Cha, em sua entrevista publicada na Revista do Professor – MEC outubro /2003, nos deixa ainda mais preocupados: " Yung diz que, para a maioria dos coreanos, o significado da educação formal está em seus valores instrumentais: a educação é, para eles, simplesmente um meio de ascensão social e de riqueza material, estando ausente a perspectiva humanitária."
"Ele ressaltou que a expansão educacional impulsionada pela cobiça humana não tem capacidade de transformar o mundo em um lugar melhor para se viver", e continua "Nossa sociedade precisa de seres humanos, generosos, que exercitem a compaixão, e não de pessoas egoístas e competitivas".
Vejam que a reflexão que a perguntado jovem professor recém-formado nos possibilita fazer, é muito mais complexa e merece nossa total atenção nos detalhes.
È claro que o erro estratégico do governo teve alguns pontos positivos, quando nos trouxe temas para reflexão que não estavam na pauta, como: preocupar com o ritmo do aluno, a importância da didática e da participação efetiva da família na escola.
Também não poderia deixar de contemplar as idéias de Karl Marx quando ele afirma, "que o trabalho, na sociedade capitalista é alienado do trabalhador porque quem produznão detém, não possui nem domina os meios de produção." e " a alienação do homem, do produto e do processo de seu trabalho é uma conseqüência da organização do capitalismo moderno."
Com muita propriedade, Frei Betto em seu artigo semanal do jornal EM 16/06/2005 Espaço Cultura, contribui dizendo que, "Um dos mais perniciosos argumentos do pensamento burguês é a idéia de que as coisas dependem de vontades individuais. Assim, a Educação não funciona bem por culpa dos professores"." Essa visão distorcida da realidade serve para encobrir os mecanismos por trás das relações pessoais. Ao delegar à esfera individual os males sociais , o sistema capitalista preserva a sua natureza cruel: é inevitável a desigualdade social neste tipo de organização" e fechando sua contribuição ele diz "Não há outra alternativa: ou reforçamos os movimentos populares" na busca por uma maior participação no processo produtivo, "ou ficaremos reféns de políticos que depois de eleitos, seguem seu próprio interesse em detrimento do interesse coletivo."
Concluindo, acredito que nós professores temos que buscar sempre a visão da totalidade em nossas reflexões da prática educativa, e humildemente entender que estamos juntos no mesmo barco, evitando assimfazer ojulgamento de nossos colegas e procurandoum culpado por nossas decepções e angustias no trabalho que com certeza não atende as nossas expectativas como categoria profissional.
Já pararam para pensar:Quem fica feliz com nossa desorganização como classe ?
Quem fica feliz quando não conseguimos nos unir e nos mobilizar politicamente?
Acredito que nosso desejo comum é de participar de um verdadeiro projeto de Educação de qualidade em nosso país.Se possível sem as demagogias atuais.
Por isso, este ponto de vista é a vista de um determinado ponto, e essa foi nossa humilde contribuição para a reflexão que se faz, urgentemente necessária, entre os educadores.
Então, volta a pergunta: Porque os professores se queixam tanto, no ambiente de trabalho?
- Celso Elias Moreira, Professor de Sociologia, da rede pública de MG – Artigo escrito em Abril / 2007
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